ENTENDA O CASO DA EMPRESA “AMERICANAS S.A.”
O caso das Americanas tomou o noticiário brasileiro em janeiro de 2023. A empresa, que tem seu capital aberto e é listada na bolsa de valores, revelou que possuíam dívidas que ultrapassavam a casa de 20 Bilhões de reais, contrariando as informações oficialmente divulgadas nos últimos anos.
Esse escândalo levou os credores da empresa a requererem a antecipação de seus pagamentos, o que consequentemente levou a empresa a requerer sua recuperação judicial, enquanto tenta se reerguer.
As inconsistências contábeis foram encontradas em operações nas quais a Americanas tomava dinheiro com os bancos para financiar fornecedores. Foi contabilizada de maneira inadequada a contratação de operações de financiamento de compras (risco sacado, forfait ou confirming).
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Americanas aprovou um relatório que concluiu que consta que o conjunto probatório, de fato, converge para o possível envolvimento de pessoas que integravam o corpo diretivo da companhia (ex-diretores e ex-executivos).
O que mais chama atenção neste caso específico é que as informações dos empréstimos estavam nos balanços apresentados aos investidores, credores, e demais interessados, no entanto, em virtude da irregularidade em sua qualificação o resultado final não refletia a realidade financeira da empresa.
Nesse sentido, destaca-se a relevância da implementação de um programa de compliance efetivo como uma ferramenta fundamental no enfrentamento de riscos e na promoção da governança corporativa das empresas de todos os portes, mas em especial nesse caso, das empresas de grande porte.
O compliance, que se refere ao cumprimento das leis, regulamentos e normas, desempenha um papel crucial na manutenção da integridade e na prevenção de práticas inadequadas em organizações. Assim, a implementação de um programa de compliance poderia ter interferido diretamente na realidade das Americanas, em virtude do que foi narrado acima, de maneira a evitar ou diminuir os prejuízos e preservar a reputação e a atividade da empresa.
A IMPORTANCIA DA IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA DE COMPLIANCE
O compliance desempenha um papel fundamental na prevenção e detecção de fraudes em organizações, pois envolve a criação e implementação de políticas, procedimentos e controles internos para garantir que a empresa opere de acordo com as leis e regulamentações aplicáveis. Segundo o IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, “Ser compliant é o cumprimento consciente e deliberado da legislação e de políticas internas, guiado pelos princípios e valores que compõem a identidade da organização, visando sua longevidade”.
Frisa-se a Importância do Programa de Compliance para Enfrentamento dos Riscos. Em uma empresa do porte das Americanas os riscos são diversos e altíssimos, portanto, o programa de compliance eficaz ajudaria a identificar, avaliar e mitigar os riscos, incluindo aí os riscos de fraudes, corrupção e outras irregularidades. Ele estabelece diretrizes para as operações da empresa, definindo padrões éticos e legais que devem ser seguidos.
Se houve fraude no caso das Americanas é importante reconhecer que a falta de governança eficaz pode ter sido um fator que contribuiu para a ocorrência dessas fraudes. A governança corporativa desempenha um papel fundamental na prevenção de práticas inadequadas, na detecção precoce de irregularidades e na promoção da transparência e da responsabilidade. Conforme definição de Monteiro, Governança Corporativa trata-se do “conjunto de práticas adotadas na gestão de uma empresa que afetam as relações entre acionistas (majoritários e minoritários), diretoria e conselho de administração”.
No Compliance o compromisso da alta gestão é crucial. A liderança da empresa deve demonstrar apoio incondicional ao programa de compliance, estabelecendo um tom ético e assegurando que a cultura de conformidade seja disseminada em toda a organização, inclusive na contratação de empresas parceiras. Além disso, os gestores devem ser responsabilizados por assegurar que as políticas de compliance sejam seguidas em suas áreas de responsabilidade.
Conforme o Princípio da Proporcionalidade, o programa de compliance deve ser adaptado ao tamanho e à complexidade da organização. Empresas maiores podem precisar de programas mais abrangentes, enquanto empresas menores podem adotar abordagens mais simplificadas. O importante é que o programa seja eficaz e adequado à empresa, e não exista apenas no papel.
O ponto que salta aos olhos no caso das Americanas é no que diz respeito a Auditoria Interna e Externa e Controladoria. Sabe-se que os departamentos de compliance realizam auditorias e monitoram atividades financeiras para identificar comportamentos suspeitos. Isso inclui a análise de dados, revisões de transações e investigações de irregularidades.
A auditoria no compliance envolve uma revisão sistemática dos processos, procedimentos e controles internos da organização para garantir que estejam alinhados com as normas e regulamentos aplicáveis.
A auditoria externa é realizada por auditores independentes ou empresas de auditoria independentes. Seu objetivo é fornecer uma opinião imparcial sobre as demonstrações financeiras de uma organização, garantindo a transparência e a conformidade com as normas contábeis.
Já a controladoria desempenha um papel significativo no contexto do compliance dentro de uma organização, pois se concentra em assegurar que os processos, práticas e procedimentos estejam em conformidade com as normas e regulamentações aplicáveis.
No caso das Americanas, tem-se registros de realização de auditorias internas e externas e todas elas deixaram de identificar as referidas inconsistências, o que leva a crer que: ou se tratava de empresas que não possuíam a técnica necessária para o trabalho, ou estavam coniventes com a fraude, e se esse for o caso devem ser responsabilizadas.
Por fim, insta ressaltar que a Lei 12.846/13, também conhecida como Lei Anticorrupção, estabelece a responsabilidade objetiva das empresas por atos de corrupção. Um programa de compliance bem implementado poderia servir como defesa da empresa para demonstrar que tomou medidas efetivas para prevenir e detectar práticas corruptas, bem como para provar que pode ser vítima de fraude e sofrer com os prejuízos dela, e não ser autora da fraude.
CONCLUSÃO
Em resumo, o compliance eficiente, adequadamente implementado e mantido, poderia ter desempenhado um papel central na proteção da reputação e da integridade das Americanas, pois teria promovido a sua conformidade com as leis e regulamentos, melhorado a governança e fortalecido a cultura ética. Além disso, poderia ter sido utilizado como uma defesa quanto as irregularidades.
Além disso, um programa de compliance bem implementado e robusto pode reduzir ou evitar sanções legais à empresa, além de auxiliar na cooperação com a investigação.
BIBLIOGRAFA
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Artigo : Veja tudo o que aconteceu no rombo da Americanas e saiba o que ainda está por vir: site < https://www.cnnbrasil.com.br/economia/veja-tudo-o-que-aconteceu-no-rombo-da-americanas-e-saiba-o-que-ainda-esta-por-vir/ > acesso em 07 de novembro de 2023.
CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO (CGU). Manual para Implementação de Programas de Integridade, 2017. Disponível em: . Acesso em: 07 de novembro de 2023.
MONTEIRO, Paulo da Veiga. E a governança corporativa? Jornal Valor Econômico. São Paulo, Caderno Eu & Meu Dinheiro, 25 mar. 2003.
RELATÓRIO FINAL. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DESTINADA A INVESTIGAR AS INCONSISTÊNCIAS DA ORDEM DE 20 BILHÕES DE REAIS DETECTADAS EM LANÇAMENTOS CONTÁBEIS DA EMPRESA AMERICANAS S.A. REALIZADOS NO EXERCÍCIO DE 2022 E EM EXERCÍCIOS ANTERIORES – CPI AMERICANAS acesso em 08 de novembro de 2023.